Metallica: há exatos 31 anos, tinham início as gravações de ‘Kill’ Em All’

Photo of METALLICA and Cliff BURTON and James HETFIELD
O METALLICA não fez exatamente uma entrada triunfal. O imigrante dinamarquês LARS ULRICH – um devoto da New Wave Of British Heavy Metal – colocou um anúncio em um jornal do sul da Califórnia – o Recycler – no fim de 1980, procurando por metalheads para fundar uma banda influenciada por Iron Maiden, Diamond Head e Tygers Of Pan Tang. JAMES HETFIELD respondeu ao anúncio e, depois de um começo difícil, o baterista Lars e o guitarrista e vocalista James fundiram o que acabaria sendo uma parceria lendária.

Depois de muito procurar e mudar, a dupla foi acrescida do guitarrista e vocalista DAVE MUSTAINE e pelo baixista CLIFF BURTON, e, com certa comoção na cena underground, chamaram a atenção do empreendedor John Zazula, também conhecido como Johnny Z.

“Nós mandamos 1500 dólares para que eles viessem do outro lado do país”, lembra John. “Eles alugaram uma van e um caminhão”. Eles tinham dois motoristas e dormiam na traseira com todo o equipamento, e eles chegaram a minha porta. Foi tipo, ‘Estamos aqui. O que fazemos agora? ’

Isso foi em abril de 1983. Ao fim daquele mês, a banda tinha assinado com o promissor selo de Johnny Z, o megaforce, estava dormindo em um local de ensaio chamado The Music Building, e tinham tomado a correta decisão de despedir ao imprevisível Dave Mustaine, colocando em seu lugar KIRK HAMMETT, do Exodus. No dia 10 de Maio, a banda foi até Rochester, Nova Iorque, para trabalhar com o produtor Paul Curcio no Music America Studios no que seria seu álbum de estreia.

“O estúdio ficava na verdade em um porão de uma casa noturna estio colonial”, lembra Lars. “No segundo andar havia um enorme sacão de baile, perfeito para se obter um bom som de bateria. O problema era que a porra do lugar era assombrado – eu tinha que estar com alguém lá em cima o tempo todo que estivesse gravando. Meus pratos começavam a rodar sem motivo algum, merda desse tipo. Era de dar medo.”

Enquanto Lars lidava com possíveis  fantasmas, James e Kirk estavam ocupados escolhendo o tipo de som de guitarra que ajudaria o Metallica a se destacar da crescente cena thrash.

“Todas as guitarras foram gravadas através dos míticos, mágicos Marshalls de James”, explica Kirk. “Foi o primeiro amp Marshall dele. Eu acho que ele mandou modificar e ele ficou com um som muito, muito bom. E eu digo ‘mítico, mágico’ porque ele não o tem mais. Logo depois que gravamos ‘Kill’Em All’ íamos fazer uns shows em Boston, e alguém arrombou o caminhão e roubou aquele Marshall.”

Em termos de guitarra, nenhum dos músicos tinha uma abundância de modelos para escolher. Na verdade, cada um só tinha uma guitarra. No caso de James era uma Flying V branca enquanto Kirk tinha uma Gibson Flying V preta. Mas serviam.

“Quando estávamos gravando as trilhas, passamos tanto tempo afinando aquelas guitarras, porque não tínhamos nenhuma guita reserva ou qualquer coisa”, explica Kirk. “Não tínhamos técnicos ou roadies no estúdio, então tínhamos que mudar as cordas nós mesmos, afinar as guitarras. O que era de boa, porque estávamos acostumados a fazer aquilo naquela altura. Não tínhamos técnicos a nossa volta 24 horas por dia como parece que temos agora quando estamos no estúdio.”

Mas, enquanto o Metallica se dedicava a certificar-se de que eles podiam fazer o melhor possível naquele disco, a juventude selvagem de cada um deles por vezes lhes afetava o julgamento. Agora, quando eles chegaram pela primeira vez a Nova Iorque, a banda ficou na impressionante mansão de Zazula. Tudo isso mudou quando eles arrombaram o armarinho de bebidas da família e beberam todo o champanhe – garrafas que haviam sido salvas do casamento de Johnny com Marsha para uma data especial.

“Eles estavam guardando aquilo fazia muito tempo”, explicou um não arrependido James alguns anos depois. “Arrancamos as rolhas e bebemos, Foi isso.”

Agora no Music America, eles voltaram a seus antigos hábitos – só um pouco a mais.

“Nós destruímos completamente aquele lugar”, admite Kirk. “Eu me senti mal depois de um tempo. Nãou vou entrar em detalhes, mas nós nunca nem lavávamos a louça. São quatro caras, entende? Tinha carpete em todos os cômodos, incluindo a cozinha e os banheiros, e nós bebíamos 24 horas por dia naquele tempo. Então você pode imaginar como é que isso acabou. Lugares úmidos não deviam nem ter tapete, mas havia carpete, e pessoas bebendo demais. Era uma zona. Mas enfim, havia um loft em cima, no segundo andar do estúdio, e ocasionalmente nós colocávamos os amps de guitarra lá por causa da ambiência, e eu me lembro de Cliff estar naquela sala com seus amps, com os fones de ouvido plugados, enquanto ele gravava ‘[Anesthesia] Pulling Teeth”, seu solo de baixo. Ele estava literalmente de pé logo em frente de seus próprios amps.”

Foi essa obra de Cliff, quase uma improvisação, que de imediato colocou o Metallica em uma divisão à parte de seus contemporâneos. Afinal, quantas bandas iniciantes sequer considerariam colocar um solo de baixo em seu disco? Mas para Kirk, havia uma certa lógica.

“Bem, antes de mais nada, aquilo é uma excelente música”, ele discorre. “Era uma faixa de destaque. Cliff era tão bom, e ele era um pensador tão original que nós só pensamos’, Wow, que ideia legal! ’. Você sabe, ao invés de um solo de guitarra, como em ‘Eruption’ de Eddie Van Halen tínhamos esse fantástico solo de baixo que Cliff comporá, por que não colocá-lo no disco? Começou a fazer parte do show ao vivo. Ele o tocava ao vivo para dar uma folga para o resto da banda, e daí a bateria voltava e ele meio que solava contra a bateria.”

Havia uma música especialmente controversa no disco: ‘The Four Horsemen’. Isso tinha começado com ‘The Mechanix’, composta por Dave Mustaine e incluída na demo ‘No Life Till Leather’. Quando Dave foi despedido, a banda refez totalmente a letra, transformando-a em uma música repleta de insinuações sexuais para uma visão mais apocalíptica. Dinheiro, como era de se prever, não rolava solto na época, e o orçamento para o estúdio só os deu de 10 a 27 de maio par agravar e mixar tudo.

Mas no esquema geral das coisas, a programação acabou sendo quase apertada demais, tal como Kirk reconta:

“Trabalhávamos das 11 da manhã até a meia-noite, por aí. E daí começávamos a beber em seguida. E eu me lembro de ter levado uma semana para gravar todos os meus solos. Mas eu quero dizer que não era o dia inteiro fazendo solos. Era tipo cinco ou seis horas de solos, e daí íamos fazer outra coisa.”

“mas quando tudo fora gravado, o engenheiro [Chris Bubacz] e o produtor decidiram que queriam mixar o álbum sozinhos, e bem por dizer nos trancaram do lado de fora do estúdio enquanto eles conduziam a mixagem, e colocaram todos esses delays e reverbs estranhos e todas essas coisas que não teríamos feito. Eis porque há tão drástica diferença entre “Kill’Em All” e “Ride The Lightning”. Há muitas coisas em “Kill’Em All que nós simplesmente não teríamos feito. E também havia coisas que tínhamos gravado que teríamos gostado de ter talvez consertado ou regravado, mas não pudemos, por causa do limite de tempo. Nosso tempo estava acabando.”

Contudo, se havia uma corrida para que o álbum fosse completado, havia outra batalha prestes a comear. A respeito do título. A banda sempre quisera chamar o disco de ‘Metal Up Your Ass’, que era o titulo de uma fita ao vivo gravada em 1982 no Old Waldorf de São Francisco. Eles tinham até uma capa elaborada – uma mão segurando uma machadinha saindo de um vaso sanitário. Não exatamente mainstream, huh? E quando chegou a notícia que os distribuidores estavam se recusando a trabalhar com tal capa, a banda teve que repensar seu ousado plano. Foi Cliff quem veio com o título alternativo, tal como lembrou James em 1986:

“Cliff disse, ‘Aqueles filhos da puta nas gravadoras, matem a todos! ’.”

O nome pegou, junto com a nova capa, com uma marreta de ferreiro repousando sobre uma poça de sangue – talvez menos impactante que a ideia original, mas igualmente nojenta. “Eu gosto muito da capa”, disse Lars, em 1984.

“A ideia de uma marreta em uma poça de sangue pode soar meio simples, mas ficou muito bonita”. O álbum foi lançado em julho de 1983 com o selo Music For Nations o distribuindo no Reino Unido e Europa. Há relatos de que apenas 1500 cópias foram prensadas a princípio, mas Kirk diz que não foi esse o caso, e que cerca de 15 mil cópias foram feitas. Em seu primeiro lançamento, o álbum chegou ao #120 das paradas dos EUA, e ao longo dos últimos 30 anos, ele vendeu mais de três milhões de cópias naquele país, e mais de 100 mil no Reino Unido. E o mais importante, esse foi o disco que de fato acendeu a fagulha do fogo thrash, e ao fazê-lo, tornou-se histórico.

“Quando ele saiu, era o feito de nossas vidas”, concluiu Kirk. “Você sabe, nosso primeiro disco. Finalmente estava no vinil. Nós podíamos segurá-lo e mostrar às pessoas e dizer, ‘Hey, olhem, fizemos um disco. Estamos no vinil!”

“Sabíamos que o Metallica, como banda, era diferente de todas as outras por aí. E estávamos nos sentindo muito, muito ansiosos para entrar no estúdio e gravar essas músicas, e tê-las em vinil prensado, sabe, pelo resto de nossas vidas, e memorizadas em vinil. E sabíamos que estávamos a caminho de algo diferente, mas eu, pessoalmente não achava que chegaríamos ás dimensões que atingiríamos. Mas estávamos determinados a cumprir uma missão -e essa missão era a dominação do mundo.”

“Kill’Em All” foi o primeiro golpe crucial para aquele objetivo.

Texto original de MALCOLM DOME para a edição inglesa da revista METAL HAMMER

 

 

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